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quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Desejos para a primavera da alma...

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Que minhas palavras sejam como pétalas de flor para colorir estradas e caminhos...

Que minhas palavras tenham a textura do momento que já passou e ficou na parte alegre de sua memória...

Que minhas palavras sejam suavemente rubras como o pôr-do-sol...



Que minhas palavras brilhem como estrelas e iluminem seus caminhos...

Que minhas palavras sejam claras como a luz do sol...

Que sejam macias como um sussurro ao pé do ouvido...



Que minhas palavras sejam ouvidas como uma bela canção...

Que elas tenham a intensidade necessária à cada situação...

Que minhas palavras sejam justas e verdadeiras...



Que minhas palavras tragam proteção e conforto...

Que minhas palavras sejam agradáveis como uma rede amarrada à sombra de uma árvore...

Que sejam límpidas como a mais terna lembrança...



Que minhas palavras sejam perenes ou momentâneas...

Que minhas palavras sejam firmes quando for necessário...

Que minhas palavras sejam como nuvens em um céu azul...

Que minhas palavras alçem voôs como balões, pipas ou bumerangues...

Que voltem de onde vieram carregadas com sua resposta...

Que ecoem pelos quatro cantos do mundo...

Que naveguem pelos sete mares...

Que se renovem como a flor...

Que frutifique...

Que originem sementes...

E que possam renascer todos os dias...

Este é o meu desejo...

Desejo que vem da alma e que volta para que amadureça em mim...



Potira

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terça-feira, 9 de setembro de 2008

Foucault citando Borges...

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“ Este livro nasceu de um texto do Borges. Do riso que, com sua leitura, perturba todas as familiaridades do pensamento – do nosso: daquele que tem nossa idade e nossa geografia – abalando todas as superfícies ordenadas e todos os planos que tornam sensata para nós a profusão dos seres, fazendo vacilar e inquietando, por muito tempo, nossa prática milenar do Mesmo e do Outro. Este texto cita uma certa enciclopédia chinesa onde está escrito que “ os animais se dividem em: a) pertencentes ao imperador, b) embalsamados, c) domesticados, d) leitões, e) sereias, f) fabulosos, g) cães em liberdade, h) incluídos na presente classificação, i) que se agitam como loucos, j) inumeráveis, k) desenhados com um pincel muito fino de pêlo de camelo, l) et cetera, m) que acabam de quebrar a bilha, n) que de longe parecem moscas.


FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. São Paulo: Martins Fontes, 1992.


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sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Sobre a difusão da cultura



Do antropólogo Ralph Linton em O homem: Uma introdução à antropologia.


“O cidadão norte-americano desperta num leito construído segundo padrão originário do Oriente Próximo, mas modificado na Europa Setentrional, antes de ser transmitido à América. Sai debaixo de cobertas feitas de algodão cuja planta se tornou doméstica na Índia; ou de linho ou de lã de carneiro, um e outro domesticados no Oriente Próximo; ou de seda, cujo emprego foi descoberto na China. Todos estes materiais foram fiados e tecidos por processos inventados no Oriente Próximo. Ao levantar da cama faz uso dos “mocassins” que foram inventados pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos e entra no quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura de invenções européias e norte-americanas, umas e outras recentes. Tira o pijama, que é vestuário inventado na Índia e lava-se com sabão que foi inventado pelos antigos gauleses, faz a barba que é um rito masoquístico que parece provir dos sumerianos ou do antigo Egito.

Voltando ao quarto, o cidadão toma as roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu meridional e veste-se. As peças de seu vestuário têm a forma das vestes de pele originais dos nômades das estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles curtidas por um processo inventado no antigo Egito e cortadas segundo um padrão proveniente das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores vivas que amarra ao pescoço é sobrevivente dos xales usados aos ombros pelos croatas do século XVII. Antes de ir tomar seu breakfast, ele olha a rua através da vidraça feita de vidro inventado no Egito; e, se estivesse chovendo, calça galochas de borracha descobertas pelos índios da América Central e toma um guarda-chuva inventado no sudoeste da Ásia. Seu chapéu é feito de feltro, material inventado nas estepes asiáticas.

De caminho para o breakfast, pára para comprar um jornal, pagando-o com moedas, invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda série de elementos tomados de empréstimo o espera. O prato é feito de uma espécie de cerâmica inventada na China. A faca é de aço, liga feita pela primeira vez na Índia do Sul; o garfo é inventado na Itália medieval; a colher vem de um original romano. Começa o seu breakfast com uma laranja vinda do Mediterrâneo Oriental, melão da Pérsia, ou talvez uma fatia de melancia africana. Toma café, planta abissínia, com nata e açúcar. A domesticação do gado bovino e a idéia de aproveitar o seu leite são originárias do Oriente Próximo, ao passo que o açúcar foi feito pela primeira vez na Índia. Depois das frutas e do café vêm waffles, os quais são bolinhos fabricados segundo uma técnica escandinava, empregando como matéria prima o trigo, que se tornou planta doméstica na Ásia Menor. Rega-se com xarope de maple, inventado pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos. Como prato adicional talvez coma o ovo de uma espécie de ave domesticada na Indochina ou delgadas fatias de carne de um animal domesticado na Ásia Oriental, salgada e defumada por um processo desenvolvido no Norte da Europa.
Acabando de comer, nosso amigo se recosta para fumar, hábito implantado pelos índios americanos e que consome uma planta originária do Brasil; fuma cachimbo, que procede dos índios da Virgínia, ou cigarro, proveniente do México. Se for fumante valente, pode ser que fume mesmo um charuto, transmitido à América do Norte pelas Antilhas, por intermédio da Espanha. Enquanto fuma, lê notícias do dia, impressas em caracteres inventados pelos antigos semitas, em material inventado na China e por um processo inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas dos problemas estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma divindade hebraica, numa língua indo-européia, o fato de ser cem por cento americano.”


LARAIA, Roque de Barros. Cultura: Um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997, p. 110-112.
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Cornita



- Pai, o que é cornita?
- Como é que se escreve?
- Ce, o, erre, ene, i, te, a.
O pai pensou um pouco. Não podia dizer que não sabia. O garoto há muito descobrira que o pai não era o homem mais forte do mundo. Precisava mostrar que, pelo menos, não era dos mais burros. Perguntou como é que a palavra estava usada.
- Aqui diz, “a cornita da igreja...” – respondeu o garoto.
- Ah, esse tipo de cornita. É um ornamento, na forma de corno, que fica do lado do altar.
- Pra que serve?
- Pra, ahn, nada. É um símbolo.
- Ah.

*

- Pai, usei “cornita” numa redação e a professora disse que a palavra não existe.
- O quê? Mas que professora é essa?
- Ela diz que nunca ouviu falar.
- Pois diga a ela que “cornita”, embora não faça mais parte da arquitetura canônica, era muito usada nas igrejas medievais.
- Tá.

*

- Pai, a professora continua dizendo que “cornita” não existe. E diz que também não se diz “arquitetura canônica”.
- Preciso ter uma conversa com essa professora. Essa educação de hoje...


*

- Não quero discutir com a senhora. Mas também não quero ver meu filho duvidando do próprio pai. Para começar, minha senhora, aqui está o livro que meu filho estava lendo. E aqui está a palavra “Cornita”.
- Deixe eu ver. Obviamente, era para ser “cornija”. É um erro de imprensa.
- O quê?
- Um erro de revisão. “Cornija”. Ornamentação muito usada na arquitetura antiga. “Cornita” não existe.
- Pai, vamos pra casa...
- Um momentinho. Um momentinho! Claro que eu sei o que é “cornija”. Mas existem duas palavras. “Cornija” e “cornita”. Duas coisas completamente diferentes.
- Então me mostre “cornita” no dicionário.
- Ora, no dicionário. E a senhora ainda confia nos nossos dicionários?
- Pai, vamos embora...


*

- O que é isto, pai?
- Um pequeno tratado que fiz para a sua professora, aquela mula, ler. Dezessete páginas. Pouca coisa. Nele, traço desde a origem etmológica da palavra “cornita”, no sânscrito, até a sua simbologia no ritual da Igreja antes do concílio de Trento, incluindo o número de vezes em que o termo aparece na obra de Vouchard de Mesquieu sobre arquitetura canônica. E sublinhei “arquitetura canônica”, para a mula aprender a jamais desmentir um pai.
- Certo, pai.


*


- Pai...
- O que é?
- A professora leu o seu tratado.
- E então?
- Mandou pedir desculpas. Diz que o senhor é um homem muito etudito.
- Erudito.
- Erudito. Mandou pedir desculpas. A burra era ela.
- Está bem, meu filho. Pelo menos agora ela sabe com quem está tratando.
Valera a pena. Valera até as noites perdidas inventando os dados do tratado. Sabia que acabaria convencendo a mulher com um ataque maciço de erudição, mesmo falsa. Vouchard de Mesquieu. Aquele fora o golpe de mestre. Vouchard de Mesquieu. Perdera uma hora só para encontrar o nome certo. Mas estava redimido.


VERÍSSIMO, Luis Fernando. Outras do Analista de Bagé. Porto Alegre: L&PM, 1982, p. 18-20.
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segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Dica de filme: Nascidos em Bordéis

Por Joana Potira




Gopala, Gopala
Deva ki ananda na gopala


Com trilha sonora Bollywood e de Krisnha Das Nascidos em Bordéis é um convite à poesia em ação. Imagens em movimento, histórias de vida e fotografias capazes de falar são parte deste belo documentário de 2004, onde o que menos importa é que foi ganhador de Oscar!


No distrito da luz vermelha de Calcutá, um grupo de crianças filhas de prostitutas tem aulas de fotografia com a fotógrafa Zana Briski. O choque cultural, o estranhamento diante da diferença mostram o quanto nossas visões também são distorcidas por preconceitos, gerando situações extremamente delicadas e até posturas autoritárias.


Uma película sobre momentos e sobre visões, modos de enchergar o mundo circundante através de câmeras fotográficas ou olhares de crianças. A poesia das cores e da vida nas ruas desta grande cidade na Índia oriental, onde o cotidiano e as culturas destes grupos sociais contrastam com uma realidade brutal frente á nossa visão ocidental. Até que ponto pode-se intervir na vida de uma pessoa?


Afinal, o que é fotografar? A fotografia é uma forma de arte? O que um fotógrafo vê?



Nascidos em Bordéis, um documentário que poderia se encaixar em categorias como fantástico, surpreendente, incrível, poético...

Fugindo dos clichês de triste história e dura realidade, que fazem parte de uma construção de estereótipos sobre as culturas da Índia...

Assita e conheça Suchitra, Manik, Gour, Avijit, Shanti Das, Puja Mukerjee, Kochi, Tapasi...




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